Livro conta a história da colonização do Pantanal na região de Rio Negro

Em seu novo livro, "Memórias de um Pantanal: Histórias de Homens e Mulheres que Desvendaram a Região do Rio Negro", jornalista Teté Martinho percorre cinco séculos em busca dos pioneiros de Mato Grosso do Sul

Marechal Cândido Rondon (1865-1958), em pé, com sua equipe a bordo da lancha Juruena, em expedição na "Bahia da Caissara" - Reprodução Everton Ballardin

O quinto capítulo do novo livro de Teté Martinho, “Memórias de um Pantanal: Histórias de Homens e Mulheres que Desvendaram a Região do Rio Negro”, apanha as mais prósperas regiões do território que seria Mato Grosso do Sul em plena expansão agro:

“A pecuária pantaneira viveu sua fase áurea do entreguerras aos anos 1970. Com o incremento do mercado internacional da carne, o Estado se insere de vez na economia nacional, exportando quantidades cada vez maiores de gado em pé para os abatedouros de São Paulo e expandindo pastagens, abates e infraestrutura. O Frigorífico Matogrossense S.A., criado em 1947, antecipa o Plano de Metas do governo Juscelino Kubitschek, que alavancou o investimento federal na indústria de base.”

É o que escreve a jornalista na abertura de “Vida de Fazenda”, nome dado àquele capítulo, que segue relatando o aumento na engorda de bovinos, no próprio estado, ante a presença do Frima (Frigorífico Marinho).

A empresa, nos anos 1960, “teria seu próprio vagão isotérmico na Noroeste, com exterior revestido de madeira e escotilhas para compartimentos de gelo nas cabeceiras”.

A jornalista encerra o primeiro parágrafo dando conta da disparada no número de cabeças. “O rebanho cresce: em 1940, o Pantanal abrigava dois milhões de bovinos. Na década seguinte, eram mais de três milhões. Em 1973, seriam cinco”.

FONTES DE PESQUISA

Mas a linha do tempo da publicação, que traz o selo da biblioteca Documenta Pantanal, começa bem antes, percorrendo cinco séculos de história em busca da origem e do legado dos primeiros ocupantes de Mato Grosso do Sul.

Teté Martinho faz uma imersão e tanto na trajetória da família do pioneiro Cyriaco Rondon (tio-avô do Marechal Cândido Rondon), que, no começo do século 20, era dono de quase metade da sub-região pantaneira conhecida hoje como Nhecolândia.

Para construir sua narrativa e contar a saga da família, a autora recorreu a antigos diários, a fotos de época, a mapas e a outros documentos herdados pelos descendentes.

Em dois anos de prospecção, a pesquisadora também entrevistou fazendeiros, empresários, historiadores e conservacionistas que ajudaram bastante na reconstituição do início do povoamento e do desenvolvimento das terras às margens do Rio Negro.

Em versão bilíngue (português e inglês), o livro que, em suas 296 páginas, sobrevoa a história de uma das nove sub-regiões do Pantanal, também mostra os movimentos que levaram à sua formação cultural.

“O fato de ter sido uma grande propriedade e a natureza impiedosa, que forçou o homem a adaptar sua atividade ao regime das cheias, inclusive a pecuária, acabaram contribuindo para preservar o ecossistema”, diz Teté.

Para Mônica Guimarães, coordenadora-geral do Documenta Pantanal, o livro da jornalista, que ganhará, em breve, lançamento em Corumbá, traz à tona um Pantanal de grande beleza e de história intrincada, pouco conhecida até para os brasileiros.

“Retraçá-la minimamente, a partir do fio condutor da descendência de um pioneiro, não teria sido possível sem a colaboração preciosa dos netos e bisnetos de Cyriaco Rondon, que se dispuseram a compartilhar as memórias da família”, reconhece Mônica.

A saga pantaneira se revela, nesse cenário, desde a busca de ouro e prata dos primeiros tempos até o combate atual ao risco de desertificação da maior área alagável do planeta.

“Tão intrigantes quanto personagens ficcionais, como o José Leôncio nas duas versões da telenovela que ajudou a popularizar a região, pessoas reais como Cyriaco Rondon e sua mulher, Thomazia, contribuem para mapear as raízes do Pantanal contemporâneo”, emenda Teté Martinho.

A AUTORA

Nascida no Rio de Janeiro em 1963, Teté Martinho acumula décadas de experiência no jornalismo cultural, com passagens pela Folha de S.Paulo (repórter, correspondente, editora e colunista), Revista Bravo! (redatora-chefe) e em outros veículos. Publicou os livros-reportagem “5 Saraus, Cada Qual com sua Poesia, Cada Qual com sua Fúria” (Imprensa Oficial, 2015) e “Guia Triângulo Histórico SP” (Estação, 2013).

A jornalista é coautora do projeto da revista Pororoca (2008-2009), sobre a Amazônia, e coordenou a edição dos catálogos, entre outros, das exposições “Eduardo Viveiros de Castro, Fotógrafo” (Sesc Ipiranga, 2017) e “Olafur Eliasson – Seu Corpo da Obra” (Sesc Pompeia, 2011). Teté ganhou o prêmio Jabuti “de prata”, na categoria Livro de Arte, por “Joseph Beuys – A Revolução Somos Nós” (Edições Sesc, 2010).

DOCUMENTA PANTANAL

O Documenta Pantanal é uma iniciativa criada em 2019 por profissionais de diferentes áreas para “tornar as fragilidades e as riquezas do Pantanal Matogrossense mais conhecidas ao público”. Por meio de “ações e conexões”, desenvolve o mapeamento cultural da região, apontando soluções de preservação e de geração de recursos para proteção.

O acervo de títulos de sua biblioteca inclui publicações dos fotógrafos João Farkas, Araquém Alcântara e Luciano Candisani, além do chef Paulo Machado e da jornalista Cláudia Gaigher.